Exercício - Questões de vestibular
UNICAMP – 2011 - Em carta ao rei D. Manuel,
Pero Vaz de Caminha narrou os primeiros contatos entre os indígenas e os
portugueses no Brasil: "Quando eles vieram, o capitão estava com um colar
de ouro muito grande ao pescoço. Um deles fitou o colar do Capitão, e começou a
fazer acenos com a mão em direção à terra, e depois para o colar, como se
quisesse dizer-nos que havia ouro na terra. Outro viu umas contas de rosário,
brancas, e acenava para a terra e novamente para as contas e para o colar do
Capitão, como se dissesse que dariam ouro por aquilo. Isto nós tomávamos nesse
sentido, por assim o desejarmos! Mas se ele queria dizer que levaria as contas
e o colar, isto nós não queríamos entender, porque não havíamos de
dar-lhe!" (Adaptado de Leonardo Arroyo, A carta de Pero Vaz de Caminha.
São Paulo: Melhoramentos; Rio de Janeiro: INL, 1971, p. 72-74.)
Esse trecho da carta de Caminha nos permite concluir
que o contato entre as culturas indígena e europeia foi:
a) favorecido pelo interesse que ambas as
partes demonstravam em realizar transações comerciais: os indígenas se
integrariam ao sistema de colonização, abastecendo as feitorias, voltadas ao
comércio do pau-brasil, e se miscigenando com os colonizadores.
X b)
guiado pelo interesse dos descobridores em explorar a nova terra,
principalmente por meio da extração de riquezas, interesse que se colocava
acima da compreensão da cultura dos indígenas, que seria quase dizimada junto
com essa população.
c) facilitado pela docilidade dos indígenas,
que se associaram aos descobridores na exploração da nova terra, viabilizando
um sistema colonial cuja base era a escravização dos povos nativos, o que
levaria à destruição da sua cultura.
d) marcado pela necessidade dos colonizadores
de obterem matéria-prima para suas indústrias e ampliarem o mercado consumidor
para sua produção industrial, o que levou à busca por colônias e à integração
cultural das populações nativas.
2. (POLI) "Duas relíquias históricas
produzidas no Brasil, foram trazidas para exibição na Mostra do
Redescobrimento, em São Paulo: o manto tupinambá e a carta de Pero Vaz de
Caminha." (Folha de São Paulo, 11 de maio de 2000.)
A carta de Pero Vaz de Caminha, sobre o
achamento do Brasil, enviada a El-Rei Dom Manuel é a principal manifestação
literária do Quinhentismo, movimento literário brasileiro do século XVI. Tendo
em vista o seu teor, podemos afirmar que os visitantes da Mostra do
Redescobrimento, ao se depararem com tal texto, conseguiriam através dele:
(A) resgatar valores e conceitos sociais
brasileiros.
(B) descobrir a história brasileira pela
arte.
(C) ter mais informações sobre a arte
brasileira.
(D) ver a cultura indígena brasileira.
X (E)
perceber o interesse português em explorar a nova terra.
3. (UFPEL) O texto a seguir servirá de base
para a próxima questão. Pero Vaz de Caminha, referindo-se aos indígenas
escreveu:
“E naquilo sempre mais me convenço que são
como aves ou animais montesinhos, aos quais faz o ar melhor pena e melhor
cabelo que aos mansos, porque os seus corpos são tão limpos, tão gordos e
formosos, a não mais poder.” […]
“Parece-me gente de tal inocência que, se nós
entendêssemos a sua fala e eles a nossa, seriam logo cristãos, visto que não
têm nem entendem crença alguma, segundo as aparências. E, portanto, se os
degredados que aqui hão de ficar aprenderem bem a sua fala e eles a nossa, não
duvido que eles, segundo a santa tenção de Vossa Alteza, se farão cristãos e
hão de crer na nossa santa fé, à qual praza a Nosso Senhor que os traga, porque
certamente esta gente é boa e de bela simplicidade. E imprimir-se-á facilmente
neles todo e qualquer cunho que lhes quiserem dar, uma vez que Nosso Senhor
lhes deu bons corpos e bons rostos, como a homens bons. E o fato de Ele nos
haver até aqui trazido, creio que não o foi sem causa. E portanto, Vossa
Alteza, que tanto deseja acrescentar à santa fé católica, deve cuidar da
salvação deles. E aprazerá Deus que com pouco trabalho seja assim.” […]
“Eles não lavram nem criam. Não há aqui boi
ou vaca, cabra, ovelha ou galinha, ou qualquer outro animal que esteja
acostumado ao convívio com o homem. E não comem senão deste inhame, de que aqui
há muito, e dessas sementes e frutos que a terra e as árvores de si deitam. E
com isto andam tais e tão rijos e tão nédios que o não somos nós tanto, com
quanto trigo e legumes comemos.”
CASTRO, Silvio. A
carta de Pero Vaz de Caminha. Porto Alegre: L&PM, 1996.
De acordo com o texto e seus conhecimentos,
marque a alternativa correta:
(A) Caminha, numa visão eurocentrista, exalta
a cultura do “descobridor”, menosprezando todos os aspectos referentes ao modo
de vida dos nativos, por exemplo, a não exploração daqueles mamíferos
placentários exóticos, citados na carta, introduzidos no Brasil quando da
colonização.
(B) Caminha realiza, através de farta
adjetivação, descrições botânicas minuciosas acerca da flora da nova terra,
destacando o tipo de alimentação do europeu — rica em vitaminas e sais minerais
— em contraposição à indígena, que é rica em lipídios.
(C) A religiosidade está presente ao longo do
texto, quando se constata que o emissor, tendo em mente a conversão dos índios
à “santa fé católica” — pretensão dos europeus conquistadores —, ressalta
positivamente a existência de crenças animistas entre os nativos.
X (D)
Na carta de Pero Vaz de Caminha, que apresenta linguagem formal, por ser o rei
português o destinatário, há forte preocupação com aspectos da necessária
conversão dos índios ao catolicismo, no contexto de crise religiosa na Europa.
(E) Ao realizar concomitantemente a narração
e a descrição dos hábitos dos nativos, o remetente destaca informações não só
do habitat como dos usos e costumes indígenas, exaltando o cultivo das plantas
de lavouras e dos pomares.
(UFLA)
Leia o texto a seguir para responder à questão.
CARTA DE PERO VAZ
A terra é mui graciosa,
Tão fértil eu nunca vi.
A gente vai passear,
No chão espeta um caniço,
No dia seguinte nasce
Bengala de castão de oiro.
Tem goiabas, melancias.
Banana que nem chuchu.
Quanto aos bichos, tem-nos muitos.
De plumagens mui vistosas.
Tem macaco até demais.
Diamantes tem à vontade,
Esmeralda é para os trouxas.
Reforçai, Senhor, a arca.
Cruzados não faltarão,
Vossa perna encanareis,
Salvo o devido respeito.
Ficarei muito saudoso
Se for embora d'aqui.
(Murilo Mendes)
castão - remate superior de uma bengala;
cruzado - antiga moeda portuguesa;
vossa perna encanareis - a expressão quer
dizer que o rei "estava mal das pernas", isto é, sem dinheiro,
"quebrado". As riquezas do Brasil poderão tirá-lo dessa situação.
Há nesse texto uma sátira à expressão
"dar-se-á nela tudo", contida na Carta de Caminha. Marque a
alternativa que confirma essa tendência.
(A) "Tem goiabas, melancias
Banana que nem chuchu."
X (B)
( ... ) "No chão espeta um caniço,
No dia seguinte nasce
Bengala de castão de oiro."
(C) "A terra é mui graciosa
Tão fértil eu nunca vi."
(D) "Quanto aos bichos, tem-nos muitos
De plumagens mui vistosas.
Tem macaco até demais."
(E) "Diamantes tem à vontade,
Esmeralda é para os trouxas.
Reforçai, Senhor, a arca.
Canção do exílio
facilitada
lá?
ah!
sabiá...
papá...
maná...
sofá...
sinhá...
cá?
bah!
(Em: Um por todos.
São Paulo:
Brasiliense, 1986.
O poema do poeta contemporâneo José Paulo
Paes, se reporta à “Canção do exílio”, de Gonçalves Dias. O texto de José Paulo
Paes Canção do exílio facilitada
A ( X )
faz uma severa crítica ao nacionalismo romântico, exacerbado na “Canção do
exílio”.
B ( ) mostra que cantar a pátria, tal como é
idealizada na “Canção do exílio”, é algo
alienante.
C ( ) reduz de forma humorística a “Canção do
exílio” a seus traços essenciais.
D ( ) reproduz todo o conteúdo da “Canção do
exílio”.
E ( ) mostra que é impossível fazer novas
versões da “Canção do exílio”.
. Leia os textos abaixo:
Texto
1
Um sabiá
na palmeira, longe
Estas aves cantam
um outro canto.
O céu cintila
sobre flores úmidas
Vozes na mata,
e o maior amor.
Só, na noite,
seria feliz:
um sabiá,
na palmeira, longe.
Onde é tudo belo
e fantástico,
só, na noite,
seria feliz.
(Um sabiá,
na palmeira, longe).
Ainda um grito de
vida e
voltar
para onde é tudo belo
e fantástico:
a palmeira, o sabiá,
o longe.
ANDRADE, Carlos
Drummondde. Nova Canção do Exílio.In Obras Completas. RJ: Editora Aguilar,
1964, p.157.
Texto 2
“Minha terra tem campos de futebol onde
cadáveres amanhecem emborcados pra atrapalhar os jogos. Tem uma pedrinha
cor-de-bile que faz “tuim” na cabeça da gente. Tem também muros de blocos (sem
pintura, é claro, que tinta é a maior frescura quando falta mistura), onde
pousam cacos de vidro pra espantar malaco. Minha terra tem HK, AR15, M21, 45 e
38 (na minha terra, 32 é uma piada). As sirenes que aqui apitam, apitam de
repente e sem hora marcada. Elas não são mais as das fábricas, que fecharam.
São mesmo é dos camburões, que vêm fazer aleijados, trazer tranquilidade e
aflição.
(BONASSI, Fernando.
Cena 9, Canção do Exílio. “15 cenas de descobrimento de Brasis”. In MORICONI,
Ítalo (org.) Os Cem Melhores Contos Brasileiros do Século. SP: Editora
Objetiva, 2001, p. 607.)
Assinale a alternativa CORRETA, em relação
aos textos de Drummond e Bonassi:
X a) Ao parodiar o poema de Gonçalves Dias,
Canção do Exílio, Fernando Bonassi mostra as representações do nosso cotidiano,
fortemente marcado pelas mudanças sociais, estabelecendo um contraste entre a
visão paradisíaca do poeta do século XIX e os limites impostos ao ser humano
decorrentes das novas relações humanas e sociais.
b) A Canção do Exílio escrita por Gonçalves
Dias e o poema Nova Canção do Exílio, de Drummond, tecem um contraponto entre
as belezas do Brasil e as de Portugal, porém no texto de Fernando Bonassi
predomina o cenário de violência e degradação humana.
c) O tema do exílio, tão caro aos poetas
românticos, estabelece uma forte relação entre o homem e a terra, cujo
componente subjetivo serve de suporte para as releituras nas obras de Drummond
e de Fernando Bonassi.
d) Os poemas dos autores referidos propõem
uma visão crítica sobre a relação entre o homem e a terra, porém no poema de
Gonçalves Dias predomina o viés racionalista e utópico.
Na passagem “Tem também muros de blocos (sem
pintura, é claro, que tinta é a maior frescura quando falta mistura), onde
pousam cacos de vidro pra espantar malaco..”, o uso dos parênteses tem a
finalidade de:
a) Caracterizar o termo antecedente, por meio
do emprego de um adjunto adnominal.
b) Evitar a ambiguidade, especificando a que
tipo de muros se refere o texto.
X c)
Inserir um comentário, em um procedimento polifônico do discurso.
d) Distinguir as vozes materializadas no
texto: a do personagem e a do narrador.
A Cidade e as Serras
Unicamp 2010 - Leia o trecho abaixo de A
cidade e as serras:
–
Sabes o que eu estava pensando, Jacinto?... Que te aconteceu aquela lenda de
Santo Ambrósio... Não, não era Santo Ambrósio... Não me lembra o santo. Ainda
não era mesmo santo, apenas um cavaleiro pecador, que se enamorara de uma
mulher, pusera toda a sua alma nessa mulher, só por a avistar a distância na
rua. Depois, uma tarde que a seguia, enlevado, ela entrou num portal de igreja,
e aí, de repente, ergueu o véu, entreabriu o vestido, e mostrou ao pobre
cavaleiro o seio roído por uma chaga! Tu também andavas namorado da serra, sem
a conhecer, só pela sua beleza de verão. E a serra, hoje, zás! de repente,
descobre a sua grande chaga... É talvez a tua preparação para S. Jacinto.
(Eça de Queirós, As
cidades e as serras. São Paulo: Ateliê Editorial, 2007, p. 252.)
a) Explique a comparação feita por Zé
Fernandes. Especifique a que chaga ele se refere.
Zé Fernandes compara
o encantamento de Jacinto com o que um homem sente diante de uma bela mulher
que ainda não lhe revelou seus defeitos. Tal comparação revela que o
encantamento que Jacinto sentia pelas serras, causado afinal pelo tédio e pela
saciedade que trouxera de Paris, o havia impedido até então de suspeitar que
aquela beleza escondia uma chaga – representada pela pobreza em que vivia uma
boa parte da população daquela região. Revela também que o ponto de vista do
narrador Zé Fernandes é mais limitado que o de Jacinto, pois aquele já conhecia
essa realidade, mas não dá mostras de se incomodar com ela, embora tenha em
outras ocasiões se mostrado indignado com a pobreza em Paris.
b) Que significado a descoberta dessa chaga
tem para Jacinto e para a compreensão do romance?
A descoberta da chaga
provoca uma profunda mudança em Jacinto. Ele deixa de ser apenas um rico
proprietário que desfruta das vantagens de seu nascimento e supera o tédio
vital de que tinha sido acometido – até então o único responsável por seu
encantamento diante da serra – pela ação social. Nesse sentido, a descoberta da
pobreza mudou a atitude de Jacinto da contemplação passiva para a intervenção
ativa. Outra possibilidade é argumentar que a transformação de Jacinto não é
tão radical quanto parece, e que, de certa forma, sua ação contra a pobreza não
se deve a sentimentos humanitários, e sim a uma continuação de seu esteticismo
– a pobreza deve ser afastada não porque causa sofrimentos, mas porque é feia,
perturba a fruição estética da beleza natural da serra. Isso necessariamente
limitaria o alcance de suas ações e denunciaria a presença de uma visão
paternalista de sociedade no romance e o caráter messiânico de seu apregoado
socialismo (o que seria confirmado pela profecia da transformação de Jacinto em
santo).
Para a compreensão do romance, o episódio é
importante por revelar que a oposição cidade X serra, ou campo X cidade, ou
França X Portugal não é simplista, quer dizer, não é a idealização de um dos
polos contra o outro. Se o culto da modernidade na vida parisiense de Jacinto
era frívolo e superficial, se a vida moderna na capital francesa corre o tempo
todo o risco da esterilidade, a descoberta da beleza e plenitude da vida nas
serras não esconde a necessidade de tirá-las do atraso. Nesse sentido, a chaga
serve de corretivo à idealização igualmente frívola da vida simples e – na
medida em que Jacinto não deixará de introduzir algumas conquistas da
civilização (como o telefone) em suas propriedades – mostra que o romance se
orienta pela busca do equilíbrio entre civilização e natureza, e não pela
oposição entre elas.
Unicamp 2011 - Questão 11
Os trechos abaixo, do Auto da barca do
inferno e das Memórias de um sargento de milícias, tratam, de maneira cômica,
dos “pecados” de duas personagens que, cada uma a seu modo, representam uma
autoridade. Leia-os com atenção e responda às questões propostas em seguida.
Frade - Ah, Corpo de Deus consagrado!
Pela fé de Jesus Cristo, qu’eu não posso
entender isto! Eu hei-de ser condenado? Um padre tão namorado e tanto dado à
virtude! Assi Deus me dê saúde que eu estou maravilhado!
Diabo - Não façamos mais detença. Embarcai e
partiremos: tomareis um par de remos.
Frade - Não ficou isso n’avença!
Diabo - Pois dada está já a sentença!
Frade - Par Deus! Essa seri’ela! Não vai em
tal caravela minha senhora Florença. Como? Por ser namorado e folgar com ua
mulher se há um frade de se perder, com tanto salmo rezado?
Diabo - Ora estás bem aviado!
Frade - Mas estás bem corregido!
Diabo - Devoto padre marido, haveis de ser cá
pingado...
(Gil Vicente, Auto da barca do inferno. São
Paulo: Ática, 2006, p. 35-36.)
Os leitores estão já curiosos por saber quem
é ela, e têm razão; vamos já satisfazê-los. O major era pecador antigo, e no
seu tempo fora daqueles de quem se diz que não deram o seu quinhão ao vigário:
restava-lhe ainda hoje alguma coisa que às vezes lhe recordava o passado: essa
alguma coisa era a Maria-Regalada que morava na Prainha. Maria-Regalada fora no
seu tempo uma mocetona de truz, como vulgarmente se diz: era de um gênio
sobremaneira folgazão, vivia em contínua alegria, ria-se de tudo, e de cada vez
que se ria fazia-o por muito tempo e com muito gosto: daí é que vinha o apelido
– regalada – que haviam juntado ao seu nome.
(Manuel Antonio de Almeida, Memórias de um
sargento de milícias. São Paulo: Ática, 2004, Capítulo XLV - “Empenhos”, p.
142.)
a)
O
que há de comum na caracterização da conduta do Frade, na peça, e do major
Vidigal, no romance?
Tanto o frade quanto
o major são apresentados como pessoas cuja conduta não condiz com a posição que
ocupam, de guardiães da moralidade e dos costumes. Em ambas as obras essa
conduta irregular é apresentada de maneira irônica, acentuando o aspecto
cômico, caricatural das personagens.
b) Que diferença entre as obras faz com que
essas personagens tenham destinos distintos?
Apesar do humor da ironia, o Auto da barca do inferno se
mantém fiel à moralidade medieval, condenando o frade ao inferno juntamente com
as outras personagens acusadas de conduta reprovável. No romance de Manuel
Antônio de Almeida, tudo é perdoado e a punição, se há, é branda e não cria
situações irremediáveis. Isso também está de acordo com seu caráter de romance
de costumes, cujo enredo não apresenta, como o Auto, um desfecho moralizador,
de advertência, mas sim um desfecho possível, de constatação.
Unicamp 2012
Os excertos abaixo foram extraídos do Auto da
barca do inferno, de Gil Vicente.
(...) FIDALGO:Que leixo na outra vida quem
reze sempre por mi.
DIABO: (...) E tu viveste a teu prazer,
cuidando cá guarecer por que rezem lá por ti!...(...)
ANJO:Que querês?
FIDALGO: Que me digais, pois parti tão sem
aviso, se a barca do paraíso é esta em que navegais.
ANJO: Esta é; que me demandais?
FIDALGO: Que me leixês embarcar. sô fidalgo
de solar, é bem que me recolhais.
ANJO: Não se embarca tirania neste batel
divinal.
FIDALGO: Não sei por que haveis por malQue
entr’a minha senhoria.
ANJO: Pera vossa fantesia mui estreita é esta
barca.
FIDALGO: Pera senhor de tal marca nom há aqui
mais cortesia? (...)
ANJO: Não vindes vós de maneira pera ir neste
navio. Essoutro vai mais vazio: a cadeira entrará e o rabo caberá e todo vosso
senhorio. Vós irês mais espaçoso com fumosa senhoria,
cuidando na tirania do pobre povo queixoso; e
porque, de generoso, desprezastes os pequenos, achar-vos-eis tanto menos quanto
mais fostes fumoso. (…)
SAPATEIRO: (...) E pera onde é a viagem?
DIABO: Pera o lago dos danados.
SAPATEIRO:Os que morrem confessados, onde têm
sua passagem?
DIABO: Nom cures de mais linguagem! Esta é a
tua barca, esta! (...) E tu morreste excomungado: não o quiseste dizer.
Esperavas de viver, calaste dous mil enganos... tu roubaste bem trint'anos o
povo com teu mester. (...)
SAPATEIRO: Pois digo-te que não quero!
DIABO: Que te pês, hás-de ir, si, si!
SAPATEIRO:Quantas missas eu ouvi, não me hão
elas de prestar?
DIABO: Ouvir missa, então roubar, é caminho
per'aqui.
(Gil Vicente, Auto da
barca do inferno, em Cleonice Berardinelli (org.), Antologia do teatro de Gil
Vicente. Rio de Janeiro: Nova Fronteira; Brasília: INL, 1984, p. 57-59
e 68-69.)
a) Por que razão específica o fidalgo é
condenado a seguir na barca do inferno? E o sapateiro?
b) Além das faltas específicas desses
personagens, há uma outra, comum a ambos e bastante praticada à época, que Gil
Vicente condena. Identifique essa falta e indique de que modo ela aparece em
cada um dos personagens
Como razão da condenação do fidalgo,
espera-se que o candidato identifique a soberba, a arrogância, a presunção, a
reivindicação de prerrogativas para os de sua classe ou a tirania exercida
sobre “o pobre povo queixoso”. O sapateiro, por sua vez, é acusado de enganar e
roubar o povo por meio de seu ofício (mester). O candidato deve ainda
identificar como falta comum aos dois personagens a prática vã da religião. No
caso do fidalgo, essa prática se evidencia no fato de ele mandar que outras
pessoas rezem em seu lugar. Já o sapateiro alega ter ouvido missas e se
confessado antes de morrer, escondendo que morrera excomungado.
Os
trechos a seguir foram extraídos de A cidade e as serras, de Eça de Queirós.
Mas dentro, no peristilo, logo me surpreendeu
um elevador instalado por Jacinto – apesar do 202 ter somente dois andares, e
ligados por uma escadaria tão doce que nunca ofendera a asma da Srª. D.
Angelina! Espaçoso, tapetado, ele oferecia, para aquela jornada de sete
segundos, confortos numerosos, um divã, uma pele de urso, um roteiro das ruas
de Paris, prateleiras gradeadas com charutos e livros. Na antecâmera, onde
desembarcamos, encontrei a temperatura macia e tépida duma tarde de Maio, em
Guiães. Um criado, mais atento ao termômetro que um piloto à agulha, regulava
destramente a boca dourada do calorífero. E perfumadores entre palmeiras, como
num terraço santo de Benares, esparziam um vapor, aromatizando e salutarmente
umedecendo aquele ar delicado e superfino.
Eu murmurei, nas profundidades do meu
assombrado ser:
– Eis a Civilização!
– Meus amigos, há uma desgraça...
Dornan pulou na cadeira: – Fogo?
– Não, não era fogo. Fora o elevador dos
pratos que inesperadamente, ao subir o peixe de S. Alteza, se desarranjara, e
não se
movia, encalhado!
(...)
O Grão-Duque lá estava, debruçado sobre o
poço escuro do elevador, onde mergulhara uma vela que lhe avermelhava mais a
face esbraseada. Espreitei, por sobre o seu ombro real. Em baixo, na treva,
sobre uma larga prancha, o peixe precioso alvejava, deitado na travessa, ainda
fumegando, entre rodelas de limão. Jacinto, branco como a gravata, torturava
desesperadamente a mola complicada do ascensor. Depois foi o Grão-Duque que,
com os pulsos cabeludos, atirou um empuxão tremendo aos cabos em que ele
rolava. Debalde! O aparelho enrijara numa inércia de bronze eterno.
(Eça de Queirós, A
cidade e as serras. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 2006, p. 28, p. 63.)
a) Levando em consideração os dois trechos,
explique qual é o significado do enguiço do elevador.
b) Como o desfecho do romance se relaciona
com esse episódio?
Espera-se que o candidato identifique o
elevador como um símbolo dos exageros e da futilidade a que pode chegar o culto
da civilização e da modernidade. O enguiço do elevador coloca em xeque, assim,
a infalibilidade da tecnologia. A partir dessa constatação, o candidato deve
concluir que a cena antecipa o desfecho do romance, no qual o protagonista
abandonará suas ilusões em relação à metrópole para iniciar uma nova vida na
terra dos seus antepassados, que ele se dedicará a transformar, afastando-se do
culto frívolo da modernidade
para explorar seu potencial humanizador.
FUVEST 2011 - Considere a seguinte alienação:
Ambas as obras criticam a sociedade mas apenas a segunda milita pela subversão
da hierarquia social nela representada. Observada a sequência, essa afirmação
aplica-se a
X a) A cidade e as serras e Capitães da
areia.
b) Vidas secas e Memórias de um sargento de
milicias.
c) O cortiço e Iracema.
d) Auto da barca do inferno e A cidade e as
serras.
e) Iracema e Memórias de um sargento de
milícias.
FUVEST 2011 - Como não expressa visão
populista nem elitista, o livro não idealiza os pobres e rústicos, isto é, não
oculta o dano causado pela privação, nem os representa como seres desprovidos
de vida interior; ao contrário, o livro trata de realçar, na mente dos
desvalidos, o enlace estreito e dramático de limitação intelectual e esforço
reflexivo .Essas afirmações aplicam-se ao modo como, na obra
a)
Auto da barca do inferno, são representados os judeus, marginalizados na
sociedade portuguesa medieval.
b) Memórias de um sargento de milícias, são
figuradas Luisinha e as crias da casa de D. Maria.
c) Dom Casmurro, são figurados os escravos da
casa de D. Glória.
X d) A cidade e as serras, são representados
os camponeses de Tormes.
e) Vidas secas, são figurados Fabiano, sinha
Vitória e os meninos.
Unifesp 2010
Instrução: As questões de números 08 a 12
baseiam-se no trecho de A Cidade e as Serras, de Eça de Queirós.
Jacinto e eu, José Fernandes, ambos nos
encontramos e acamaradamos em Paris, nas escolas do Bairro Latino – para onde
me mandara meu bom tio Afonso Fernandes Lorena de Noronha e Sande, quando
aqueles malvados me riscaram da universidade por eu ter esborrachado, numa
tarde de procissão, na Sofia, a cara sórdida do Dr. Pais Pita.
Ora nesse tempo Jacinto concebera uma
ideia... Este príncipe concebera a ideia de que o homem só é “superiormente
feliz quando é superiormente civilizado”. E por homem civilizado o meu camarada
entendia aquele que, robustecendo a sua força pensante com todas as noções
adquiridas desde Aristóteles, e multiplicando a potência corporal dos seus
órgãos com todos os mecanismos inventados desde Teramenes, criador da roda, se
torna um magnífico Adão quase onipotente, quase onisciente, e apto portanto a
recolher dentro de uma sociedade e nos limites do progresso (tal como ele se
comportava em 1875) todos os gozos e todos os proventos que resultam de saber e
de poder... Pelo menos assim Jacinto formulava copiosamente a sua ideia, quando
conversávamos de fins e destinos humanos, sorvendo bocks poeirentos, sob o
toldo das cervejarias filosóficas, no Boulevard Saint-Michel.
Este conceito de Jacinto impressionara os
nossos camaradas de cenáculo, que tendo surgido para a vida intelectual, de
1866 a 1875, entre a Batalha de Sadowa e a Batalha de Sedan e ouvindo
constantemente desde então, aos técnicos e aos filósofos, que fora a espingarda
de agulha que vencera em Sadowa e fora o mestre-de-escola quem vencera em
Sedan, estavam largamente preparados a acreditar que a felicidade dos
indivíduos, como a das nações, se realiza pelo ilimitado desenvolvimento da mecânica
e da erudição. Um desses moços mesmo, o nosso inventivo Jorge Calande, reduzira
a teoria de Jacinto, para lhe facilitar a circulação e lhe condensar o brilho,
a uma forma algébrica:
suma ciência
X = suma felicidade.
suma potência
08. Conforme o pensamento de Jacinto, que
ganhou a forma algébrica desenvolvida por Jorge Calande, a concepção de um
homem superiormente feliz envolve
(A) a dissimulação da força e da sabedoria.
(B) a busca pela simplicidade.
X (C) o conhecimento e o progresso
científico. x
(D) a dissociação entre progresso e
filosofia.
(E) o distanciamento dos preceitos
filosóficos.
09. Se a civilização era enaltecida por
Jacinto, era de se esperar que, para ele, a vida apartada do progresso
(A) ficaria consideravelmente limitada,
reduzindo-se a prática intelectual.
(B) aguçaria a intelectualidade, ampliando a
relação do homem com o saber.
(C) daria espaço para o real sentido de viver
e de tornar-se uma pessoa feliz.
(D) equilibraria a relação do homem com o
saber, permitindo-lhe ser pleno e feliz.
X (E) impediria a felicidade do homem, sem,
contudo, influenciar a prática intelectual. x
10. Considere as afirmações.
I. O Realismo surge num momento de grande
efervescência do cientificismo. No texto, isso se comprova pelas referências à
vida intelectual e ao desenvolvimento da sociedade do século XIX.
II. Um personagem como Fabiano, de Vidas
Secas, conforme descrito no trecho – Vermelho, queimado, tinha os olhos azuis,
a barba e os cabelos ruivos; mas como vivia em terra alheia, cuidava de animais
alheios, descobria-se, encolhia-se na presença dos brancos e julgava-se cabra.
– seria infeliz na ótica de Jacinto, apresentada no texto.
III. Ora, como tudo cansa, esta monotonia
acabou por exaurir-me também. Quis variar, e lembrou-me escrever um livro. Jurisprudência,
filosofia e política acudiram-me, mas não me acudiram as forças necessárias.
Essas palavras de Dom Casmurro, na obra homônima de Machado de Assis, assinalam
uma personagem preocupada com o desenvolvimento da erudição, candidata à
felicidade postulada por Jacinto.
Está correto o que se afirma em
(A) I apenas.
(B) II apenas.
(C) I e II apenas.
(D) II e III apenas.
X (E) I, II e III. x
Nota para a atividade
Faça um balanço pessoal... para esta atividade escolhi algumas questões, entretanto todas são de vestibulares recentes de universidade públicas.... avalie-se e veja o quão fácil ou difícil foi para identificar a alternativa correta, o raciocínio adequado para responder conforme foi esperado.
A partir daqui, não faça como os poetas que têm metas inatingíveis.... trace suas metas. Inscreva-se em cursos vestibulares, busque bolsas de estudo e atinjam seus objetivos.
Dicas de filmes:
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